Por Tatiane Medeiros
*Missionária em Portugal
Muito provavelmente, você já ouviu alguma ministração ou leu algum texto que fala sobre o que está escrito em Atos 20:35b: “Em tudo o que fiz, mostrei a vocês que é preciso trabalhar arduamente para ajudar os que estão em necessidade, lembrando as palavras do próprio Senhor Jesus, que disse: ‘Mais bem-aventurada coisa é dar do que receber’”.
Geralmente, fazemos uma conexão muito primária dessa agem com o ensinamento bíblico de Jesus sobre a generosidade, quando não a resumimos a um ato simplesmente monetário de compartilhar recursos. No entanto, quero compartilhar algo que vai além de uma doação que pode ser recuperada (dinheiro), mas que envolve algo que jamais teremos novamente: nossa vida (tempo).
Estar no campo missionário (já que esse é nosso foco aqui) é, acima de qualquer coisa, uma imensa compreensão de que você não tem sua vida como preciosa, e que nenhuma realização poderá alcançar o nível de satisfação de saber que estamos cumprindo o que Deus determinou ao nosso respeito. O apóstolo Paulo descreve esse sentimento em Atos 20:24: “Mas em nada tenho a minha vida por preciosa, contanto que cumpra com alegria a minha carreira, e o ministério que recebi do Senhor Jesus, para dar testemunho do evangelho da graça de Deus”.
Esse entendimento é imprescindível para o sucesso da nossa missão: saber que não há nada mais importante que poderíamos estar realizando. O apóstolo Paulo foi um exemplo nesse sentido. Ele era judeu da tribo de Benjamim e possuía cidadania romana, foi educado como fariseu e estudou em Jerusalém sob a tutela do renomado rabino Gamaliel, um dos mestres mais respeitados de seu tempo.
Agora, vamos imaginar um cenário em que o apóstolo Paulo não tivesse ado pela experiência da conversão e convocação ao chamado para o ministério. Sua trajetória até então o apontava para se tornar um grande líder religioso dentro do judaísmo, um importante rabino na sua época, ou até uma autoridade dentro do sinédrio. Por ser também romano, ocupava uma posição destacada, que poderia levá-lo a ser uma espécie de mediador entre o sinédrio e as autoridades romanas, o que lhe permitiria desempenhar um papel diplomático nas relações.
Entre o império e a comunidade judaica
Isso tudo são apenas conjecturas acerca de seu futuro, que estava sendo desenhado até o momento em que ele se encaminhava para Damasco com o propósito de prender cristãos e então tem uma experiência com Jesus, sendo conduzido até Ananias, lugar onde tem seu momento de conversão e batismo.
Voltando ao texto de Atos 20:24 e analisando a fala do apóstolo a partir dessa ótica, podemos imaginar o peso que havia em sua declaração ao dizer: “Em nada tenho minha vida como preciosa”. Um nível tão grande de consciência da convocação de Deus ardia em seu coração que ele não considerava nenhum desses cenários hipotéticos como maiores do que o que estava se apresentando diante dele agora. Pelo contrário, havia uma clareza dentro dele sobre o que o aguardava mais à frente.
Momentos antes, nos versos 22-23, ele relata: “E agora, eis que, ligado eu pelo espírito, vou para Jerusalém, não sabendo o que lá me há de acontecer, senão o que o Espírito Santo, de cidade em cidade, me revela, dizendo que me esperam prisões e tribulações”.
Mesmo com a instrução de que o Espírito Santo compartilhava sobre o que o esperava, ele não se negava a cumprir aquilo que lhe era designado: dar testemunho das boas-novas da graça de Deus. A conversão de Paulo e a decisão subsequente de deixar todas as projeções de um futuro brilhante dentro da comunidade judaica para trás, e assumir seu chamado, doando-se às pessoas que antes perseguia e para quem, provavelmente, teria que construir uma nova imagem, tornou possível uma mudança na história da religião.
O apóstolo Paulo se tornou um dos maiores missionários do cristianismo, levando o Evangelho aos gentios e deixando um legado espiritual e teológico que construiu o cristianismo como conhecemos hoje. Ele era incansável em seu trabalho missionário, em suas viagens, ao fundar igrejas e nas cartas que escreveu, que são parte fundamental das Escrituras. Ele foi preso diversas vezes durante seu ministério e, por seu histórico, sabia o que o aguardava, mas foi esse mesmo homem que escreveu em Filipenses 4:4: “Regozijai-vos sempre no Senhor; outra vez digo, regozijai-vos”.
Há, de fato, uma alegria incomparável na decisão de entregar-se ao chamamento de Deus em nossa vida, com a compreensão de que estamos dando daquilo que realmente nos é valioso, nossa vida, em prol de que o Reino de Deus seja anunciado, e que se cumpra em nós e através de nós o que está escrito em Mateus 28:19-20:
“Portanto, ide, ensinai todas as nações, batizando-as em nome do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo; ensinando-as a guardar todas as coisas que eu vos tenho mandado; e eis que eu estou convosco todos os dias, até à consumação dos séculos. Amém.”